Segundo o desembargador Alexandre Victor de Carvalho, a definição de crimes hediondos no ordenamento jurídico brasileiro sempre gerou intensos debates doutrinários e jurisprudenciais, especialmente quando se trata de delitos sexuais cometidos antes da vigência da Lei 12.015/09. Um exemplo emblemático dessa discussão se deu no julgamento do Incidente de Uniformização de Jurisprudência no processo nº 1.0145.05.225639-6, ocorrido no Tribunal de Justiça de Minas Gerais.
Veja como neste caso, o desembargador assumiu o papel central ao apresentar um voto divergente e fundamentado sobre a classificação de estupro e atentado violento ao pudor como crimes hediondos quando praticados em sua forma simples.
A divergência na Corte e a posição do Desembargador
O processo analisado surgiu diante da necessidade de pacificação do entendimento sobre a natureza hedionda dos crimes de estupro e atentado violento ao pudor cometidos antes da alteração legislativa de 2009. Coube ao desembargador Alexandre Victor de Carvalho relatar o caso, apresentando voto detalhado e cuidadoso que, embora vencido, trouxe uma importante interpretação jurídica.

Para o desembargador, os delitos mencionados, se praticados em sua forma simples — ou seja, sem a ocorrência de lesão grave ou morte — não devem ser enquadrados como crimes hediondos. Em seu voto, o desembargador baseou-se na redação original da Lei dos Crimes Hediondos (Lei 8.072/90), que, segundo ele, somente qualificava como hediondos os crimes de estupro e atentado violento ao pudor quando resultavam em consequências mais graves.
Fundamentação jurídica e respeito ao princípio da taxatividade
Um dos pontos centrais do voto do desembargador Alexandre Victor de Carvalho foi o respeito ao princípio da taxatividade. Conforme explicou em sua fundamentação, não se pode estender a tipificação hedionda para situações não expressamente previstas na lei. O desembargador fez questão de mencionar que a própria Lei 12.015/09, ao criar a figura do estupro de vulnerável, trouxe de maneira clara sua inclusão no rol dos crimes hediondos, o que não acontecia antes com as formas simples dos delitos.
Adotando essa linha de raciocínio, o desembargador propôs que somente os crimes que resultassem em lesão corporal grave ou morte fossem considerados hediondos, conforme interpretação literal da Lei 8.072/90. Ele afirmou que seu entendimento já havia sido sustentado anteriormente, inclusive com apoio em decisões do Supremo Tribunal Federal, fortalecendo o argumento de que a forma simples dos crimes analisados não atendia aos requisitos legais para a classificação como hediondos.
Decisão colegiada e a manutenção do entendimento majoritário
Apesar da solidez do voto do desembargador Alexandre Victor de Carvalho, a maioria dos membros da Corte Superior do TJMG optou por seguir interpretação mais abrangente. O voto vencedor, proferido pelo desembargador Antônio Armando dos Anjos, adotou o entendimento de que tanto as formas simples quanto as qualificadas dos crimes de estupro e atentado violento ao pudor são hediondas, mesmo se praticadas antes da Lei 12.015/09.
A posição vencida do desembargador, contudo, permanece relevante. Ela reforça a importância da interpretação legal precisa e da preservação de garantias fundamentais no processo penal, como a legalidade estrita. Seu voto, mesmo não acolhido pela maioria, alimenta o debate jurídico e contribui para a evolução da jurisprudência em casos semelhantes, respeitando os direitos e garantias individuais.
Conclui-se assim que, o julgamento do Incidente de Uniformização de Jurisprudência nº 1.0145.05.225639-6 evidencia a complexidade da aplicação da Lei dos Crimes Hediondos aos delitos sexuais praticados antes da Lei 12.015/09. O voto do desembargador Alexandre Victor de Carvalho, embora vencido, demonstrou profundo conhecimento jurídico. A divergência entre os magistrados não apenas enriquece o debate, mas reafirma a relevância de decisões bem fundamentadas para a construção de uma jurisprudência justa.
Autor: Roman Lebedev